Preocupação

Preocupação

 

PREOCUPAÇÃO

Jaécio Matos Santos

“Não vos aflijais, nem digais: Que comeremos? Que beberemos? Com que nos vestiremos? São os pagãos que se preocupam com tudo isso. Ora, vosso Pai celeste sabe que necessitais de tudo isso. Buscai em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça e todas estas coisas vos serão dadas em acréscimo. Não vos preocupeis, pois, com o dia de amanhã: o dia de amanhã terá as suas preocupações próprias. A cada dia basta o seu cuidado”. (Mateus 6:31-34).

Meu avô dizia que quando um problema não tem solução é porque esse problema já está resolvido. Portanto, não cabia mais qualquer preocupação em torno dele. Isso não quer dizer que não devamos tentar, a qualquer custo, resolver os problemas que nos afligem. Porém, alguns problemas ultrapassam a nossa capacidade humana de resolvê-los, nos deixando impotentes para achar a solução. Entendi, pois, que meu avô estava querendo dizer que não era para nós ficarmos perdendo tempo, ocupando a nossa mente com algo que não nos traria proveito algum.

A palavra preocupação pode ser analisada no seu aspecto temporal, pois nos remete ao passado, estando no presente, mas vislumbrando o futuro. O termo pré-ocupação, em sentido figurado, significa ocupar-se antecipadamente com algo que ainda vai (ou pode) acontecer. O ato de se preocupar é natural, mas pode ser maléfico ou benéfico ao ser humano.

Quando será que a precupação pode ser nociva às nossas mentes? Quando passamos a ocupá-las com coisas banais e sem importância, impedindo a livre reflexão do pensamento e a consciência para agir em busca da solução dos problemas.

Quando Jesus disse: “Não vos preocupeis com o que vais comer, vestir...” O Mestre se refere exatamente a isso: que não devemos ser escravos das coisas porque o mais importante é buscar o Reino de Deus e a sua justiça. Preocupar-se excessivamente com tais coisas se torna nocivo, porque aliena a mente, causa depressão e bloqueia o nosso agir em torno de uma “causa justa”.

Por outro lado, a preocupação pode ser benéfica. Quando entendemos que precisamos achar uma solução para um determinado problema ( a curto, médio e/ou longo prazos) estamos fazendo , nada mais, nada menos, do que um projeto. E todo projeto exige um planejamento para uma ação (pré-ocupação), visando a solução de um dado problema. Nesse sentido, preocupar-se se torna saudável, porque a mente estaria ocupada com algo que pode trazer benefícios diversos.

O nosso viver em sociedade deve se constituir nesse dinâmico processo de “pensar-agir” em torno de problemas, procurando maneiras inteligentes para solucioná-los. Esse livre processo contínuo do pensamento-ação é a chave para abertura ou liberação da consciência (individual e coletiva) nos tornando humanos úteis e proativos (intelectualidade verdadeira*) na sociedade. Como já dizia Karen Horney: “A preocupação deveria levar-nos à ação e não à depressão”.

O grande problema é quando a mente se torna “oficina do diabo”: Aquela mente vazia que dá lugar para o mal, ou está ocupada com as coisas banais dessa vida; ou até mesmo carregada de conhecimentos, porém desconectados de uma  ação social benéfica (intelectualidade falsa).

O não se precupar com o dia de amanhã, porque o amanhã pertence a Deus, não se traduz em acomodação mental. Quer dizer simplesmente que os problemas de hoje (atemporal) são mais importantes e exigem muito mais da nossa atenção e esforço para resolvê-los hoje! No mais tardar, até à meia noite! “A cada dia basta o seu cuidado”.

Buscar em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça é dar prioridade às causas do amor (amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo), da fé, da justiça e da salvação, em uma sociedade injusta e desigual. Fazendo assim, as demais coisas necessárias para o nosso viver serão devidamente acrescentadas, sem maiores traumas ou preocupações. Isso sim que é viver e crer no verdadeiro evangelho.

Com essa mensagem, Jesus estaria lançando a base fundamental para a construção de uma sociedade livre, fraterna, democrática e igualitária. Entretanto,  teorias política-econômica-sociais capitalista ou socialista não conseguiram decifrar ainda o “espírito da coisa”, infelizmente! Mas, a mensagem central do Mestre ainda persiste: “Arrependei-vos e crede no evangelho! ” (Marcos 1:15).

* Segundo o filósofo francês Julien Benda,  os verdadeiros intelectuais são criaturas raras, uma vez que defendem padrões de justiça e de verdade que não são precisamente deste mundo. Para Benda, os verdadeiros intelectuais não buscam essencialmente objetivos práticos, satisfação pessoal, isto é, vantagens materiais. O verdadeiro intelectual fala a verdade sem medo de represálias, como se diz no senso comum: “põe a boca no trombone”, este verdadeiro intelectual denuncia casos de corrupção e injustiça social.