Cristão: evangélico ou espírita?

Cristão: evangélico ou espírita?

Recentemente, tive acesso à obra do teólogo e professor universitário paraibano Severino Celestino da Silva, que escreveu o livro intitulado “Analisando as Traduções Bíblicas”. O livro teve grande repercussão no Brasil, com três edições em menos de dois anos, e tem em sua espinha dorsal a pretensão de defender o Espiritismo como uma doutrina cristã.

 

Segundo o autor, o fundamento do espiritismo é a própria bíblia sagrada, que admite em suas práticas os fenômenos mediúnicos e a reencarnação, além de apresentar um conteúdo moral e espiritual de relacionamento com Deus indiscutível. Celestino defende a bíblia está repleta de feitos mediúnicos realizados pelos profetas, que eram, na verdade, grandes médiuns. Diz, também, que a doutrina da reencarnação está em toda a Bíblia, seja nos livros dos profetas, seja na história do povo hebreu ou mesmo nos ensinamentos de Jesus, que chegou a afirmar que João Batista era o Elias que já vivera no tempo dos Reis de Israel e que havia voltado reencarnado no corpo de João Batista. Para ele, a bíblia, além de não condenar a doutrina espírita, mostra a inexistência de religiões ao passo que leva o indivíduo a refletir sobre a prática da caridade, sobre o amor ao próximo e sobre a fé, que é morta em si mesma se não for acompanhada das obras.

 

De modo singelo e objetivo, vou enfrentar esses principais pontos expostos por Celestino em seu livro, sem a pretensão de esgotar o assunto, até porque seria necessário muito mais que um simples artigo para defender o que nos foi apresentado em um livro.

 

Alterando a ordem da exposição dos argumentos de Celestino, começo concordando com ele no que diz respeito à ética espírita. De fato, os seguidores da doutrina espírita são um exemplo de comportamento no que diz respeito à humildade e ao amor ao próximo, coisas rara inclusive no meio evangélico.

 

Não há dúvida de que alguns postulados da doutrina espírita são baseados em princípios cristãos. Reconhecemos que a prática espírita é gratuita, a exemplo do que Jesus nos ensinou: “Dai de graça o que de graça recebeste” (Mt. 10,8). Não é preciso muitas linhas para lembrar do quanto os espíritas trabalham em socorro a órfãos e idosos desamparados, o que é uma demonstração de amor. O fato é que os espíritas são eficientes na prática do bem e da caridade. Eles mantêm em todos os Estados brasileiros asilos, orfanatos, escolas para pessoas carentes, creches e outras instituições de assistência e promoção social, visando unicamente ao bem do próximo e não os vemos tocando trombeta para serem louvados por isso, o que é compatível com o ensinamento de Jesus:

 

"1 Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso Pai celeste. "2 Quando, pois, deres esmola, não toques trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, para serem glorificados pelos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa. "3 Tu, porém, ao dares a esmola, ignore a tua mão esquerda o que faz a tua mão direita;" (Mateus 6:1-3)

 

Na questão da humildade, os números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de acordo com o Censo 2000, conhecemos uma verdade interessante. Já em 2000 o grupo espírita era o terceiro maior grupo religioso do País, com 2,3 milhões de adeptos, e colocava-se como o segmento social de maior renda e escolaridade, situação que se repetiu no Censo de 2010.

 

A comparação da distribuição das pessoas de 10 anos ou mais de idade por rendimento mensal domiciliar per capita revelou que os evangélicos pentecostais são os que têm maior proporção de pessoas ganhando até 1 salário mínimo (63,7%), número superior ao grupo sem religião (59,2%). No outro extremo, o das classes de rendimento acima de 5 salários mínimos, destaca-se o grupo de pessoas que se declararam espíritas.

 

Ou seja, os espíritas é que são “cabeças” em nosso país, mas não fazem propaganda disso e nem usam essas informações para atrair adeptos. Por outro lado, os crentes, cada vez mais ousados em testemunhar prosperidade, são mais pobres até mesmo que os grupos que se declararam sem religião. Não fossem os números estatísticos continuaríamos pensando que a teologia da prosperidade está realmente funcionando. Mas, pelo constatado, o que funciona mesmo é a propaganda e o engodo.

 

Nesse aspecto, notamos que o grupo evangélico que adota a teologia da prosperidade anda mesmo é na contramão dos princípios bíblicos. Trombeteiam a todo tempo. Quando fazem alguma obra social, fazem muita propaganda. Também, não se cansam de anunciar seus testemunhos particulares de prosperidade, dando a impressão de que o ingresso de seus dízimos na igreja garante-lhes exponencial enriquecimento. Curiosamente, as estatísticas mostram que os evangélicos não são nem os mais prósperos e nem os mais cultos cidadãos brasileiros.

 

Portanto, parece que os espíritas praticam preceitos cristãos que boa parte dos evangélicos nem mesmo conhecem.

 

Entretanto, isso não é suficiente para afirmar que os espíritas sejam fiéis seguidores do cristianismo com base na bíblia, tal qual foi originalmente escrita por homens inspirados por Deus.

 

O fato é que a bíblia sagrada não admite entre suas práticas fenômenos mediúnicos e nem mesmo a doutrina reencarnação, conforme defende Celestino. Segundo ele, a doutrina espírita foi codificada por Allan Kardec em 1857, enquanto a Bíblia foi escrita há mais de mil anos e, por isso, os escritos bíblicos não poderiam condenar uma doutrina espírita, já que esta surgiu muito tempo depois.

 

Mas, nós sabemos que a bíblia sagrada, mesmo em seus livros legislativos, históricos e poéticos está repleta de indicações proféticas, que não excluíram de seus ensinamentos advertências sobre heresias futuras, senão vejamos:

 

"1 Assim como, no meio do povo, surgiram falsos profetas, assim também haverá entre vós falsos mestres, os quais introduzirão, dissimuladamente, heresias destruidoras, até ao ponto de renegarem o Soberano Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição." (2 Pedro 2:1)

 

"31 Não vos voltareis para os necromantes, nem para os adivinhos; não os procureis para serdes contaminados por eles. Eu sou o Senhor, vosso Deus. " (Levítico 19:31)

 

"9 Quando entrares na terra que o Senhor, teu Deuste der, não aprenderás a fazer conforme as abominações daqueles povos. "10 Não se achará entre ti quem faça passar pelo fogo o seu filho ou a sua filha, nem adivinhador, nem prognosticador, nem agoureiro, nem feiticeiro; "11 nem encantador, nem necromante, nem mágico, nem quem consulte os mortos; "12 pois todo aquele que faz tal coisa é abominação ao Senhor; e por estas abominações o Senhor, teu Deus, os lança de diante de ti. "13 Perfeito serás para com o Senhor, teu Deus. "14 Porque estas nações que hás de possuir ouvem os prognosticadores e os adivinhadores; porém a ti o Senhor, teu Deus, não permitiu tal coisa. " (Deuteronômio 18:9-14)

 

Quando vos disserem: Consultai os necromantes e os adivinhos, que chilreiam e murmuram, acaso, não consultará o povo ao seu Deus? A favor dos vivos se consultarão os mortos?” (Isaías 8:19 RA)

 

Mas, a bíblia sagrada não apenas vaticinou sobre heresias futuras, tais como a consulta a necromancia, mas, também, reprovou os homens que a praticaram, senão vejamos:

 

"13 Assim, morreu Saul por causa da sua transgressão cometida contra o Senhor, por causa da palavra do Senhor, que ele não guardara; e também porque interrogara e consultara uma necromante" (1 Crônicas 10:13)

 

"1 Tinha Manassés doze anos de idade quando começou a reinar e cinqüenta e cinco anos reinou em Jerusalém. "2 Fez o que era mau perante o Senhor, 6 (...) era agoureiro, praticava feitiçarias, tratava com necromantes e feiticeiros e prosseguiu em fazer o que era mau perante o Senhor, para o provocar à ira. " (2 Crônicas 33:1, 2 e 6)

 

O Novo Testamento, inclusive, revela que os espíritos que incorporam pessoas que praticam adivinhação são espíritos malignos, senão vejamos:

 

"16 Aconteceu que, indo nós para o lugar de oração, nos saiu ao encontro uma jovem possessa de espírito adivinhador, a qual, adivinhando, dava grande lucro aos seus senhores. (...) "18 Isto se repetia por muitos dias. Então, Paulo, já indignado, voltando-se, disse ao espírito: Em nome de Jesus Cristo, eu te mando: retira-te dela. E ele, na mesma hora, saiu. " (Atos 16:16, 18)

 

Assim, não subsiste a afirmação de Celestino, uma vez que há mais de dois mil anos Deus já havia descrito com clareza que consulta a mortos é uma abominação, totalmente incompatível com a prática religiosa judaica, no Velho Testamento, ou cristã, no Novo Testamento.

 

Interessante é que Celestino procura afastar o livro de Deuteronômio de sua tese afirmando que este é voltado para o Judaísmo e, sendo o Espiritismo uma religião cristã, não pode ser condenado por uma religião judaica. Parece que ele se esqueceu do fato de Cristo ser judeu e ter citado exatamente passagens do livro de Deuteronômio para repreender o Diabo no deserto (Mt 4:1-11; Lc 4:1-13). Ora, se Cristo referiu-se ao livro de Deuteronômio como sendo a palavra de Deus, como afastá-lo do cristianismo?

 

Buscando, ainda, compatibilizar a doutrina espírita com a cristã, Celestino destaca que a justiça divina é rigorosamente cumprida, havendo recompensa para os bons e cobrança para os maus, não existindo, contudo, penas eternas, de modo que é preciso trabalhar para corrigir o mal que foi praticado contra o semelhante.

 

De fato, a palavra de Deus nos assegura que aquilo que o homem semear, isso colherá, mostrando que nós é que seremos os responsáveis por nossa condenação, caso escolhamos o caminho mau. Entretanto, é impossível compatibilizar a sua afirmação seguinte, porque a bíblia é muito clara em afirmar que há penas eternas, senão vejamos:

 

"31 Quando vier o Filho do Homem na sua majestade e todos os anjos com ele, então, se assentará no trono da sua glória; "32 e todas as nações serão reunidas em sua presença, e ele separará uns dos outros, como o pastor separa dos cabritos as ovelhas; "33 e porá as ovelhas à sua direita, mas os cabritos, à esquerda; "34 então, dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. (...) 41 Então, o Rei dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eternopreparado para o diabo e seus anjos. (...) 46 E irão estes para o castigo eterno, porém os justos, para a vida eterna." (Mateus 25:31-34; 41 e 46)

 

Celestino, também, afirma que encontramos em todas as páginas da bíblia fenômenos mediúnicos incontestáveis, realizados pelos profetas que eram, na verdade, “grandes médiuns”.

 

Segundo o autor, o fundamento do espiritismo é a própria bíblia sagrada, que admite em suas práticas os fenômenos mediúnicos e a reencarnação, além de apresentar um conteúdo moral e espiritual de relacionamento com Deus indiscutível. Celestino defende a bíblia está repleta de feitos mediúnicos realizados pelos profetas, que eram, na verdade, grandes médiuns. Diz, também, que a doutrina da reencarnação está em toda a Bíblia, seja nos livros dos profetas, seja na história do povo hebreu ou mesmo nos ensinamentos de Jesus, que chegou a afirmar que João Batista era o Elias que já vivera no tempo dos Reis de Israel e que havia voltado reencarnado no corpo de João Batista. Para ele, a bíblia, além de não condenar a doutrina espírita, mostra a inexistência de religiões ao passo que leva o indivíduo a refletir sobre a prática da caridade, sobre o amor ao próximo e sobre a fé, que é morta em si mesma se não for acompanhada das obras.

 

Sobre a reencarnação, dos 23 capítulos do livro de Celestino, oito se dedicam a demonstrar a reencarnação na Bíblia. Deixando de lado os diversos argumentos que não apontam textos bíblicos específicos, enfrentaremos apenas as passagens em que o autor refere-se a alguma passagem da bíblica evangélica.

 

Começando por Abraão, Celestino afirma que no texto de Gn 17:7, quando Deus diz a Abraão: "Estabelecerei a minha aliança entre mim e ti e a tua descendência no decurso das suas gerações, aliança perpétua, para ser o teu Deus e da tua descendência", o termo gerações pode ser substituído por encarnações, de modo que a semente de Abraão seria uma sequência de encarnações.

 

Tal afirmação não tem qualquer fundamento bíblico. Deus manteve sua aliança pelas gerações seguintes de Abraão até chegar em Jesus, mas não há qualquer indicativo de que a alma de Abraão tenha encarnado em qualquer de seus descendentes.

 

"17 De sorte que todas as gerações, desde Abraão até Davi, são catorze; desde Davi até ao exílio na Babilônia, catorze; e desde o exílio na Babilônia até Cristo, catorze." (Mateus 1:17)

 

Logo, se Celestino quer defender esta sua teoria, não tem como fazê-la a partir de textos bíblicos pelo simples fato de não haver sustentação para tal tese. Ao contrário, como já vimos, só há textos que expressamente contrariam sua alegação.

 

Seguindo em frente, Celestino cita a passagem em que Deus diz ao profeta Jeremias que o conhecia antes dele ser concebido, sugerindo que a alma de Jeremias já existia antes de seu nascimento no século VI a.C.

 

"5 Antes que eu te formasse no ventre materno, eu te conheci, e, antes que saísses da madre, te consagrei, e te constituí profeta às nações." (Jeremias 1:5)

 

Mais uma vez, não há como compatibilizar o texto bíblico com a doutrina da reencarnação. O fato de Deus conhecer Jeremias antes dele ter sido formado não significa que ele já existia. Significa somente que Deus é presciente. O próprio Deus nos afirma que Ele pode trazer a existência o que nunca existiu. Ora, ninguém cria algo do nada sem antes tê-lo imaginado e projetado. Por isso, todos nós que hoje existimos um dia fomos imaginados e projetados antes de nascermos. E aquele que nos projetou certamente pode dizer que nos conheceu antes de sermos formados.

 

"17 como está escrito: Por pai de muitas nações te constituí, perante aquele no qual creu, o Deus que vivifica os mortos e chama à existência as coisas que não existem." (Romanos 4:17)

 

"4 Quem fez e executou tudo isso? Aquele que desde o princípio tem chamado as gerações à existência, eu, o Senhor, o primeiro, e com os últimos eu mesmo." (Isaías 41:4)

 

Na sequência, Celestino afirma que o próprio Cristo nunca negou a reencarnação. Ao contrário, em Mateus 11: 13-14 Ele afirma textualmente que João Batista era o Elias que já vivera no tempo dos Reis de Israel e que havia voltado reencarnado no corpo de João Batista.

 

Evidentemente, a simples harmonização desta passagem com o restante da bíblia já seria suficiente para nos mostrar que Jesus não se referia à reencarnação, mas à continuidade do ministério do profeta Elias. Em Lucas 1:15-17, lemos que João Batista viria "no espírito e virtude de Elias", ou seja, para continuar o ministério profético que Elias desempenhou no Antigo Testamento (e não que João Batista seria o próprio Elias).

 

Corrobora com essa informação a declaração do próprio profeta João Batista, senão vejamos:

 

"19 Este foi o testemunho de João, quando os judeus lhe enviaram de Jerusalém sacerdotes e levitas para lhe perguntarem: Quem és tu? "20 Ele confessou e não negou; confessou: Eu não sou o Cristo. "21 Então, lhe perguntaram: Quem és, pois? És tu Elias? Ele disse: Não sou. És tu o profeta? Respondeu: Não." (João 1:19-21)

 

Há, ainda, um detalhe interessante que nos revela com clareza que Elias não estava reencarnado em João Batista: Elias não morreu, mas foi arrebatado (2 Rs 2:11) assim como Enoque (Hb 11:5). Ora se alguém não morreu, mas subiu ao céu, permanecendo vivo e com o seu próprio corpo, se voltasse deveria voltar com o seu próprio corpo, já que ele não teria sido afetado pela decomposição, mas apenas sofrido uma transformação para se tornar incorruptível, ou seja, permanente. Vejamos o que Paulo nos diz acerca dos corpos que não morrerem por ocasião do arrebatamento da igreja:

 

"50 Isto afirmo, irmãos, que a carne e o sangue não podem herdar o reino de Deus, nem a corrupção herdar a incorrupção. "51 Eis que vos digo um mistério: nem todos dormiremos [morreremos], mas transformados seremos todos, "52 num momento, num abrir e fechar de olhos, ao ressoar da última trombeta. A trombeta soará, os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós [os vivos] seremos transformados. "53 Porque é necessário que este corpo corruptível [carne hunana] se revista da incorruptibilidade [durabilidade eterna], e que o corpo mortal se revista da imortalidade. "54 E, quando este corpo corruptível se revestir de incorruptibilidade, e o que é mortal se revestir de imortalidade, então, se cumprirá a palavra que está escrita: Tragada foi a morte pela vitória." (1 Coríntios 15:50-54)

 

Como se sabe, a própria doutrina espírita afirma que para haver a reencarnação deve haver a morte primeiro, de modo que uma alma fique sem o seu corpo, perdido pela decomposição (corrupção).

 

Ainda em relação a Elias e João Batista, é bom lembrar que foi Elias quem apareceu no Monte da Transfiguração (Mt 17:1-3). Ora, João já havia morrido naquela ocasião. Se ele fosse a reencarnação de Elias, quem teria que aparecer seria João Batista, já que este seria seu último corpo.

 

É bom esclarecer que na passagem da transfiguração, embora os discípulos tivessem subido o monte com Jesus, viveram, tal como Paulo (2 Co 12:1-4), um momento no céu e não na terra, já que jamais teriam condições de reconhecer Moisés ou Elias, a quem nunca tinham visto, caso não estivessem no plano espiritual e não terreno.

 

Quanto às passagens bíblicas que relatam a imortalidade de alma, Celestino somente se afasta da verdade bíblica quando afirma que não há condenação eterna e que o Sheol (inferno) é um lugar de passagem temporária, jamais uma região de tormentos eternos. Segundo ele, o cântico de Ana, em 2 Sm 2:6 mostra que Deus não deixa a alma no Sheol. Vejamos o texto:

 

"6 O Senhor é o que tira a vida e a dá; faz descer à sepultura e faz subir." (1 Samuel 2:6)

 

Para desfazer qualquer confusão, é bom lembrar que o mesmo Deus que dá a vida (física) é o mesmo que pode tirá-la. O corpo pode descer à sepultura (fisicamente) pela morte, mas a alma não permanece ali, uma vez que todos hão de se apresentar perante Deus. Todos os mortos serão chamados de suas sepulturas, ainda que tenham morrido no mar ou em outro lugar, para estar diante do criador no dia do juízo final, para a condenação eterna (definitiva), senão vejamos:

 

"11 Vi um grande trono branco e aquele que nele se assenta, de cuja presença fugiram a terra e o céu, e não se achou lugar para eles. "12 Vi também os mortos, os grandes e os pequenos, postos em pé diante do trono. Então, se abriram livros. Ainda outro livro, o Livro da Vida, foi aberto. E os mortos foram julgados, segundo as suas obras, conforme o que se achava escrito nos livros. "13 Deu o mar os mortos que nele estavam. A morte e o além entregaram os mortos que neles havia. E foram julgados, um por um, segundo as suas obras. "14 Então, a morte e o inferno foram lançados para dentro do lago de fogo. Esta é a segunda morte, o lago de fogo. "15 E, se alguém não foi achado inscrito no Livro da Vida, esse foi lançado para dentro do lago de fogo." (Apocalipse 20:11-15)

 

Do ponto de vista da salvação é bom lembrar que Jesus afirma que o homem tem que nascer de novo para ser salvo, fazendo morrer o velho homem, pecador, para o surgimento de um novo homem, purificado. Nesse mesmo sentido, a palavra de Deus nos mostra que o homem que vive escravizado pelo pecado está morto. E no momento em que aceita a salvação proposta por Jesus (arrependimento, confissão e perdão) passa a viver, saindo da morte para a vida. Vejamos alguns textos bíblicos que nos dão essa segurança:

 

“Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados,” (Efésios 2:1 RA)

 

“A isto, respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que, se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.” (João 3:3 RA)

 

“Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida.” (João 5:24 RA)

 

Logo, a palavra de Deus considera que a vida em pecado significa a morte da alma e que o sacrifício de Jesus para expiar nossos pecados nos purifica de tal modo que deixamos a sepultura (morte) e passamos para a vida (ressurreição), bastando, para tanto, nos arrependemos e confessarmos os nossos pecados para recebermos o perdão e, consequentemente, a salvação da condenação da morte eterna. Isso é sair da morte para a vida, chamada de ressurreição, e nada tem a ver com a volta de um espírito da região dos mortos (hades) para reencarnar em um novo ser humano.

 

Prosseguindo em seus argumentos, sobre a imortalidade da alma, sugerindo a possibilidade de reencarnação, Celestino apresenta como referência a parábola do homem rico e o mendigo Lázaro (Lc 12,13), bem como a passagem do juízo final em Mateus 25:31-46. Entretanto, ambas as passagens são definitivamente contrárias à doutrina espírita da reencarnação e do aperfeiçoamento da alma a cada etapa.

 

A primeira porque afirma expressamente que uma alma não pode retornar ao mundo físico, nem mesmo para advertir familiares sobre a realidade do sofrimento eterno. Ademais, deixa claro que após a morte não há mais a possibilidade de mudança de situação. A condenação é definitiva e não há oportunidade para se “melhorar” e alterar o juízo estabelecido, senão vejamos:

 

"22 Aconteceu morrer o mendigo e ser levado pelos anjos para o seio de Abraão; morreu também o rico e foi sepultado. "23 No infernoestando em tormentos, levantou os olhos e viu ao longe a Abraão e Lázaro no seu seio. "24 Então, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim! E manda a Lázaro que molhe em água a ponta do dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama. "25 Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro igualmente, os males; agora, porém, aqui, ele está consolado; tu, em tormentos. "26 E, além de tudo, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que querem passar daqui para vós outros não podem, nem os de lá passar para nós. "27 Então, replicou: Pai, eu te imploro que o mandes à minha casa paterna, "28 porque tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de não virem também para este lugar de tormento. "29 Respondeu Abraão: Eles têm Moisés e os Profetas; ouçam-nos. "30 Mas ele insistiu: Não, pai Abraão; se alguém dentre os mortos for ter com eles, arrepender-se-ão. "31 Abraão, porém, lhe respondeu: Se não ouvem a Moisés e aos Profetas, tampouco se deixarão persuadir, ainda que ressuscite alguém dentre os mortos." (Lucas 16:22-31)

 

A segunda passagem citada (Mateus 25:31-46) deixa igualmente claro que há condenação eterna e imutável:

 

41 Então, o Rei dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eternopreparado para o diabo e seus anjos. (...) 46 E irão estes para o castigo eterno, porém os justos, para a vida eterna." (Mateus 25:41 e 46)

 

Ainda, Celestino defende que o Evangelho Segundo o Espiritismo não é outro livro senão a própria bíblia. Afirma que se trata de uma coletânea de versículos extraídos da própria Bíblia, mas interpretados pelos espíritos e que contém orientações maravilhosas.

 

Não se discute que o Evangelho Segundo o Espiritismo contém preceitos firmados nos princípios bíblicos e que, por isso, são todos excelentes. Naquilo que o espiritismo preserva os valores e princípios bíblicos, a exemplo da humildade, do amor e do caráter moral irrepreensível não há como negar sua utilidade.

 

O que se questiona neste artigo são as incompatibilidades entre a doutrina espírita e a doutrina cristã evangélica, especialmente no que diz respeito ao modo como se processa a salvação da alma do homem.

 

Segundo Celestino, não há dúvidas de que a vontade de Deus é que ninguém se perca (Mt 18:14) e, por isso, todos entrarão no reino dos céus, inclusive os publicanos e as meretrizes (Mt. 21:31), que precederão os hipócritas e manipuladores da verdade.

 

Para nós, cristãos evangélicos, entretanto, a salvação da alma está condicionada ao arrependimento de pecados. Aquele que se arrepende é perdoado por meio da fé no sacrifício de Jesus, exclusivamente. Pode ser publicano, ladrão, meretriz, assassino etc., havendo arrependimento, há perdão e salvação. Mas, se não há arrependimento, não há perdão e, consequentemente, não há salvação.

 

"15 E disse-lhes: Ide por todo o mundo e pregai o evangelho a toda criatura. "16 Quem crer e for batizado será salvo; quem, porém, não crer será condenado." (Marcos 16:15-16)

 

Mesmo aquele que deixou o pecado e experimentou a vida deve cuidar para não retornar à sua condição anterior. Jesus, após curar um paralítico, que não podia andar havia 38 anos, deixou-lhe a seguinte advertência:

 

“Mais tarde, Jesus o encontrou no templo e lhe disse: Olha que já estás curado; não peques mais, para que não te suceda coisa pior.” (João 5:14 RA)

 

Também, a profecia do apocalipse é bastante clara que nem todos entrarão no reino do céu. Neste ponto, a doutrina espírito é totalmente incompatível com a bíblia sagrada, em especial com o cristianismo. João, ao receber a revelação diretamente de Jesus, afirmou o seguinte:

 

“14  Bem-aventurados aqueles que lavam as suas vestiduras no sangue do Cordeiro, para que lhes assista o direito à árvore da vida, e entrem na cidade pelas portas. 15  Fora ficam os cães, os feiticeiros, os impuros, os assassinos, os idólatras e todo aquele que ama e pratica a mentira.” (Apocalipse 22:14-15 RA)

 

E, ao contrário do que acreditam os espíritas, o cristão evangélico crê que há uma única oportunidade para se definir o destino da alma e esta ocorre em sua vida aqui na terra, apenas uma vez e, depois, disto, todos deverão ser julgados segundo as suas obras.

 

"27 E, assim como aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo," (Hebreus 9:27)

 

Por fim, o fato do espiritismo ter criado uma bíblia paralela, interpretada particularmente apenas com textos selecionados extraídos de um contexto geral, cabe uma última afirmação de incompatibilidade com a própria bíblia. No último livro da bíblia, o apóstolo João nos alerta sobre o perigo de se extrair um texto do seu contexto ou mesmo de se fazer acréscimos ao que o Espírito Santo de Deus selou em um livro. Embora João estivesse se referindo especificamente ao livro do apocalipse, sua advertência não deve ser desconsiderada em outros contextos.

 

"18 Eu, a todo aquele que ouve as palavras da profecia deste livro, testifico: Se alguém lhes fizer qualquer acréscimo, Deus lhe acrescentará os flagelos escritos neste livro; "19 e, se alguém tirar qualquer coisa das palavras do livro desta profecia, Deus tirará a sua parte da árvore da vida, da cidade santa e das coisas que se acham escritas neste livro. " (Apocalipse 22:18-19)

 

Esperando ter trazido luz àqueles que ainda não conseguiam diferenciar o cristianismo evangélico do cristianismo espírita, desejo que todos possam ser melhor esclarecidos pela oração e pela leitura devocional da palavra de Deus.

 

Que Deus abençoe a todos!

 

Brasília/DF, em 30 de março de 2013.

Pr. Sólon Lopes Pereira