Carta 224

02/07/2013 17:04

DATA DA PUBLICAÇÃO: 1/3/2012

 

De: MARIA

Para: "celeiros.df@gmail.com"

Data: 29 de fevereiro de 2012 12:07

Assunto: dúvida texto da bíblia

Pr. apdSJ, sei que o Sr disse que não responde mais e-mails anônimos mas eu só entrei com esse e-mail porque tenho um parente e um irmão da igreja que sempre visitam o seu site e não quero ser identificada.

Mas me tire uma dúvida, esses dias andei lendo alguns sites, algumas coisas que irmãos escreveram e alguns criticam o fato de que na ICM temos cultos todos os dias exceto sexta...

só que lendo a palavra eu vi que em atos 2:46 diz:

...e perseverando unânimes todos os dias no templo..."

não seria por este motivo que a igreja adotou cultos todos os dias?

Eu não vejo problemas em ter cultos todos os dias... o problema q eu vejo é que quando você não vai à igreja por estar cansado, ou por ter ido visitar a família... ou por estudo ou por qualquer outro motivo as pessoas acham que você está pecando, está sem comunhão, coisas do tipo.

Eu vejo problema por isso se tornar uma obrigação e não uma alegria pra qualquer crente mas no meu coração não sinto que estou perdendo a salvação quando deixo de ir ao culto por algum dos motivos que citei.

O Sr pode me esclarecer essa dúvida quanto ao texto da palavra?

E também acho que as coisas perdem o sentindo quando você passa a ir apenas por obrigação porque o Senhor conhece o coração dos seus servos. Não adianta estar lá todos os dias e estar sem comunhão... é apenas uma opinião.

Obrigada mais uma vez.

 

De: celeiros.df@gmail.com

Para: MARIA

Data: 1 de março de 2012 12:25

Assunto: dúvida texto da bíblia

 

Prezada irmã, que a paz do Senhor Jesus seja com toda a sua casa.

Primeiramente, vamos observar o versículo que você citou no seu contexto.

Os discípulos aguardavam o cumprimento da promessa de Jesus acerca do derramamento do Espírito Santo (At 1:8) e, cumprida a profecia no dia do pentecostes (At 2:1-3), muitas pessoas afluíram para o local onde os discípulos estavam reunidos.

Aproveitando a oportunidade, Pedro tomando a palavra e fez um discurso impactante (At 2:14-36) que acrescentou quase três mil pessoas ao número de crentes (At 2:41).

Esse grupo, recém convertido, estava absolutamente compungido pela mensagem de Pedro, pelo derramar do Espírito Santo (At 2:2-4), pela manifestação sobrenatural das línguas (At 2:5-12) e pelo batismo nas águas (At 3:41).

Não era de se admirar que todos quisessem ouvir mais sobre Jesus e sobre o seu evangelho de boas novas. Todos estavam sedentos e desejosos para aprender com os discípulos. Assim, as reuniões eram naturais, espirituais, necessárias e ansiosamente desejadas por todos os crentes. Não era uma obrigação e ninguém lhes disse que Deus havia revelado que fizessem desse modo.

A prática das reuniões diárias estendiam-se para as casas (At 2:46) e não se limitavam aos momentos em que se achegavam ao templo onde normalmente aconteciam grandes concentrações de pessoas.

A igreja de Cristo estava nascendo!

Visto o contexto, vamos agora lembrar que o livro de atos é um livro de registros históricos e que é impossível interpretar cada versículo como uma expressão daquilo que Deus queria que acontecesse.

Para exemplificar, podemos citar o texto em que os apóstolos estão em grande contenda. Estaríamos, então, sendo estimulados à contenda, já que os apóstolos fizeram isso? Ora, se um fato histórico não condiz com os ensinamentos de Jesus, devo considerá-los apenas como registro da história bíblica, nada mais. E isso não significa que o registro histórico não tenha sido feito pelo Espírito Santo, já que toda a bíblia é inspirada. Desse entendimento resulta que pareceu necessário ao Espírito de Deus registrar um fato histórico para o nosso conhecimento da verdade, ainda que retratem fatos que o Senhor reprova, senão vejamos.

“Tendo havido, da parte de Paulo e Barnabé, contenda e não pequena discussão com eles, resolveram que esses dois e alguns outros dentre eles subissem a Jerusalém, aos apóstolos e presbíteros, com respeito a esta questão.” (Atos 15:2 RA)

Por isso, amada, entendo que nem todos os registros do livro de Atos devem ser interpretados como uma ordenança. Veja, a seguir, os dois versículos anteriores ao que você citou para justificar os cultos diários:

“44 Todos os que creram estavam juntos e tinham tudo em comum. 45  Vendiam as suas propriedades e bens, distribuindo o produto entre todos, à medida que alguém tinha necessidade.” (Atos 2:44-45 RA)

Agora, vejamos o verso citado por você:

Diariamente perseveravam unânimes no templo, partiam pão de casa em casa e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de coração,” (Atos 2:46 RA)

Se você considerar que o verso 46 do capítulo 2 do livro de Atos expressa uma ordem ou uma manifestação da vontade de Deus para os nossos dias, por que não considerar os dois versos anteriores com o mesmo rigor?

Então, querida, você conhece alguma igreja de Cristo que hoje tem essa prática? Você já conhece alguém em sua igreja que tenha vendido uma casa grande em um bairro nobre da cidade para comprar três menores na periferia, ficando com uma e doando as outras duas para irmãos que não possuem casas?

Por que as pessoas simplesmente ignoram esse texto bíblico e o tratam apenas como história de um tempo onde “as coisas eram diferentes”?

O que normalmente vejo são pessoas que nem mesmo dízimos querem entregar. Não fazem nada pelo seu irmão e não participam com nada em favor daqueles que estão dispostos a fazer. É claro que há líderes religiosos que só pensam em construir templos e pregar na televisão, sem mostrar a menor sensibilidade quando um membro da igreja está passando necessidades. Mas, o erro dos egoístas, materialistas e vaidosos não pode ser o nosso parâmetro. Pergunto: são todos os líderes evangélicos ladrões, desonestos, interesseiros e mau caráter?

O fato de existirem homens maus não deveria nos servir de desculpa ou mesmo nos impedir de fazer o bem.

Honestamente, penso que o texto de Atos que estamos examinando não tem sido acolhido nem mesmo como um bom exemplo para os nossos dias. Até mesmo quando alguns crentes dão dízimo estão agindo em favor de seus interesses materiais e egoístas, pensando em ganhar 100 vezes mais ou coisas do gênero da prosperidade. Outros, nem entregam o dízimo porque, “no fundo”, são egoístas, avarentos e materialistas. Falam da desonestidade dos pastores para se justificarem. Com esse argumento, buscam alívio para suas consciências e, certamente, lá no céu dirão a Deus: “eu não participei com nada dos meus bens porque o senhor, Deus, colocou à frente de sua igreja um monte de ladrões”. Então, a culpa será do próprio Deus?

Pessoalmente, meu parâmetro não é o homem que faz o mal, mas Jesus (altruísta) e sua palavra (verdade), além dos ensinamentos de Paulo (doutrina) e os fatos históricos que o Espírito Santo decidiu registrar para nos servir de exemplo do que é bom e do que não é bom fazer.

Enfim, amada, voltando à questão das reuniões diárias, que integra o mesmo contexto das atitudes altruístas dos primeiros cristãos, parece-me que o fato das reuniões diárias no templo e da repartição de bens entre cristãos terem sido registradas no livro de Atos devem nos servir como um exemplo de algo bom a ser feito, estando, inclusive, alinhado ao princípio altruísta de Jesus. Mas, não acho que isso deva ser tomado como uma ordem de Deus.

Faço essa observação para que você veja que não é razoável associarmos quem faz cultos diários a quem tem mais “revelação” de Deus ou a quem esteja mais afinado com a vontade de Deus. Em absoluto! Isso nada tem a ver com espiritualidade, mas com métodos e estratégias eclesiásticas para o alcance de seus objetivos.

O argumento de que nós devemos nos alimentar todos os dias também não é válido para justificar cultos diários. Na verdade, quem faz esse tipo de afirmação apenas está “forçando uma barra” para manter os cultos bem freqüentados diariamente.

Ora, eu me alimento todos os dias, mas isso não significa que eu só possa comer em um restaurante. Tem dias que eu me alimento em casa, tem dias que eu me alimento no meu trabalho e tem dias que eu me alimento em diversos restaurantes da cidade.

Se eu quiser espiritualizar isso, terei que admitir que eu não tenho que me alimentar espiritualmente todos os dias no templo físico onde a igreja se reúne. Posso me alimentar da palavra de Deus em minha casa, pela leitura bíblica. Também, posso me alimentar da palavra de Deus nas reuniões do grupo evangélico do meu trabalho ou em reuniões de grupos menores, para troca de conhecimentos e experiências bíblicas. Ainda, posso alimentar a minha fé pelo ouvir da palavra de Deus assistindo a uma pregação de um tele-evangelista ou a uma pregação pela internet.

Quem pode afirmar que nós só alimentamos o nosso espírito e a nossa fé quando vamos à igreja diariamente? Acho temerário defender essa prática, porque ela, a meu ver, não tem sustentação bíblica doutrinária.

Porém, querida, eu não estou dizendo que reuniões diárias não sejam boas, produtivas e, em alguns casos, necessárias.

Como eu disse no começo, os novos nascidos da igreja primitiva tinham a necessidade de aprender mais sobre o evangelho de Jesus e somente os discípulos estavam, naquele momento, em condições de testemunhar sobre o projeto de Deus em Jesus. Lembre-se que não havia nenhum evangelho escrito no início. Toda informação vinha pela transmissão verbal do testemunho dos discípulos e, somente bem mais tarde, por meio das cartas de Paulo.

Além disso, os convertidos enfrentavam muita resistência naquele tempo, tanto dos integrantes da religião judaica (fariseus, saduceus etc.) como do próprio Império Romano que, em certo momento, buscou aniquilar os cristãos.

Com todas essas necessidades, não é de se estranhar que, além da repartição de bens materiais, houvesse um grande desejo dos crentes de se reunirem diariamente, no templo e de casa em casa.

Por outro lado, sabemos que o escritor da carta aos Hebreus nos ensinou a compartilhar o amor e as boas obras e, em seguida, nos advertiu a não deixarmos de congregar. Mas, não se disse que deveríamos nos reunir em um templo físico diariamente. Apenas disse que é importante que estejamos compartilhando o amor, as boas obras e, também, nos congregando, senão vejamos:

“24  Consideremo-nos também uns aos outros, para nos estimularmos ao amor e às boas obras. 25  Não deixemos de congregar-nos, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima.” (Hebreus 10:24-25 RA)

Embora eu entenda que seja proveitosa toda reunião espiritual, não creio ser apropriado induzir as pessoas a pensar que isso deve ser feito diariamente e no templo. Aliás, eu acho que, para alguns propósitos de discipulado, eu alcanço melhor os objetivos bíblicos ao fazer algumas reuniões em casas do que em cultos formais no templo.

Mas, essa é uma questão a ser administrada pela liderança de cada grupo religioso e eu não vejo problemas em uma igreja ter a estratégia de realizar cultos diários. Até por que há casos em que algumas igrejas mantêm suas portas abertas ininterruptamente, colocando-se à disposição para receber pessoas necessitadas a qualquer hora do dia.

Também, há aqueles que dizem que têm algo extraordinário a transmitir todos os dias. Que assim seja! Só não acho razoável fazer com que as pessoas se sintam culpadas por não estar no templo todos os dias, seja porque trabalham ou estudam, seja porque estão doentes ou mesmo cansadas.

Pessoalmente, eu desaprovo tudo o que é feito por imposição, mesmo quando essa ela é dissimulada com mensagens do tipo: “Deus revelou que devemos fazer assim e nós amamos mais a Deus do que a nós mesmos e somos fiéis”. Tal mensagem tem o potencial de transmitir, indiretamente, a seguinte ideia: ou você faz o que Deus revelou ou você não ama a Deus e não é fiel.

Por isso, entendo que não podemos deixar de ler a bíblia, examinar e julgar as doutrinas que nos são passadas como “revelação de Deus”. Toda doutrina bíblica deve estar amparada pela bíblia, não é mesmo?

Fora isso, até posso aceitar que muitas práticas das denominações são bem intencionadas e procuram edificar o corpo de Cristo, mas repudio as manipulações que podem fazer mal às pessoas, tirando-lhes a liberdade e as induzindo a servir a Deus por obrigação, para não se sentirem culpadas e infiéis.

Espero tê-la ajudado a pensar melhor sobre a questão que você colocou.

O Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o seu rosto e te dê a paz.

Grande abraço,

Pastor Sólon.

 

celeiros.df@gmail.com