Carta 096

02/07/2013 14:48

De: JOÃO

Para Pastor Solon

Em: 2 de junho de 2010 15:13

Pastor Sólon,

Sou membro da ICM (Acredito que por pouco tempo... rs) e me identifiquei muito com seu testemunho. Estou abrindo minha mente para a verdadeira liberdade cristã. Sou muito bem resolvido com minhas idéias a respeito da bíblia e não ligo para o que os ICM falem de mim. Podem falar que sou rebelde e questionador... não ligo. Recentemente fui para o banco porque visitei uma igreja assembléia de Deus. Fomos minha esposa, meu cunhado, a noiva dele e eu. Fomos todos para o banco. E isso tem me movido mais ainda a entender a essência do evangelho.

Mas vamos ao que interessa: Gostaria de saber a sua opinião e embasamento bíblico sobre a imposição de mãos. Na ICM só os diáconos e superiores impõem as mãos. O que nos dá a autoridade para isso? Qualquer um com a graça do Espírito Santo está apto para impor as mãos? Inclusive as mulheres? Na minha opinião qualquer crente está apto a esse ato. Estou certo? Gostaria de um esclarecimento completo sobre isso.

Um abraço e que Deus continue te abençoando neste trabalho!

 

De: Pr. Sólon

Para: JOÃO

Em: 4 de junho de 2010 01:04

Prezado irmão JOÃO, que a paz do Senhor Jesus seja com toda a sua família.

 Sobre a imposição de mãos, há alguma controvérsia entre os teólogos. Se você tiver um pouco de paciência, farei algumas considerações sobre o assunto no próximo mês, quando eu sair de férias. Perdoe-me por não poder atender sua solicitação neste momento, pois tive que eleger algumas prioridades para não falhar com os compromissos que já assumi.

 Desejo a você e a toda a sua família muito sucesso, paz e prosperidade espiritual.

 

 

De: Pr. Sólon

Para: JOÃO

Data: 15 de julho de 2010 22:11

Prezado irmão JOÃO, que a paz do Senhor Jesus seja com toda a sua família.

Como prometido, vou fazer alguns comentários sobre o ato bíblico da imposição de mãos. Como você já deve ter lido em algum outro lugar no site, não sou dono da verdade e nem tenho a pretensão de ser. Vou apenas compartilhar um pouco do que aprendi com alguns homens de Deus, seja através de aulas, de conversas ou de leitura especializada. Afinal, nunca recebi ensino bíblico por sonhos.

Epithesis é como escrevemos o termo grego que significa “imposição sobre”. Trata-se de um termo composto por suas partes: epi + tithemi (sobre + pôr). Esse termo é usado no Novo Testamento nas circunstâncias que passo a apontar.

Em primeiro lugar, vamos notar uma referência bíblica em Hb 6:2 sobre a doutrina da “imposição” de mãos que deve ser abandonada. Esta refere-se ao ato então ordenado pela lei de Moisés aos israelitas em relação à transmissão do pecado a um cordeiro que seria imolado em seguida para remissão do pecador. A exemplo, temos os sacrifícios de paz (Lv 3:2,8,13; 4:29,33); os sacrifícios pelos pecados dos sacerdotes (Lv 4:4; 16:21), dos anciãos (Lv 4:15) e dos príncipes (Lv 4:24). O princípio subentendido neste ato era a identificação por parte daquele que o fazia com o animal sobre o qual se impunham as mãos, transferindo-lhe seus pecados para depois fazê-los desaparecer (remissão) pelo sacrifício do animal. O autor de Hebreus, portanto, está afirmando que aquele ritual deveria ser abandonado com a introdução da fé em Jesus, já que a partir de Jesus nós transferimos nossos pecados para o cordeiro perfeito de Deus, pela fé, mediante o arrependimento e a confissão dos pecados.

Resta-nos, agora, observar o que a bíblia nos ensina sobre o ato de imposição de mãos. No livro de Atos dos Apóstolos, temos alguns registros sobre a imposição de mãos realizada pelos apóstolos sobre aqueles que criam no evangelho que estava sendo anunciado. Com a imposição das mãos dos apóstolos, os novos crentes recebiam de imediato o batismo no Espírito Santo, como ocorreu em Samaria (At 8:17,18) e em Éfeso (At 19:6). É bom lembrar que o próprio Paulo foi batizado no Espírito Santo imediatamente após receber a imposição de mão de Ananias (At 9:12,17). Apenas para registro, tais manifestações sobrenaturais serviram de sinal e testemunho, especialmente para os judeus, e não há outras passagens bíblicas que nos mostre a continuação desse fenômeno depois da época e das circunstâncias narradas em At 19:6.

O mesmo não observamos quanto à imposição de mãos para trazer cura a enfermos. O correspondente verbo Epitithemi (acrescentar a, deitar sobre) foi usado, entre outros casos, para designar o ato de “impor” as mãos nos doentes para curá-los. Tanto Jesus como os apóstolos praticaram este ato, conforme se vê nos seguintes textos: Mt 9:18; 19:13,15; Mc 5:23; 6:5; 7:32; 8:23,25; Lc 4:40; 13:13; At 28:8. Merece destaque o fato de que Jesus afirmou que todos aqueles que viessem a crer poderiam praticar o ato de imposição de mãos para curar doentes e que isso seria um sinal que acompanharia os crentes, conforme se vê a seguir:

17 E estes sinais seguirão aos que crerem: Em meu nome expulsarão os demônios; falarão novas línguas; 18 Pegarão nas serpentes; e, se beberem alguma coisa mortífera, não lhes fará dano algum; e se impuserem as mãos sobre os enfermos, eles ficarão curados. (Mc 16:17,18)

Não podemos deixar de notar que o ato de imposição de mãos com esse propósito não foi proibido a nenhuma pessoa que viesse a crer no evangelho de Jesus, seja homem ou mulher. Assim, não há qualquer base bíblica para restringirmos este ato a apenas alguns ministros especiais de Deus. No meu modo de perceber o referido texto, qualquer crente em Jesus tem autoridade para impor suas mãos sobre um enfermo e vê-lo curado, pela fé.

Há alguns casos de imposição de mãos, entretanto, que levam-nos a crer que são restritos a algumas autoridades especiais para delegar ou transmitir o que receberam de Deus. Neste caso, apenas quem tem algo pode transmiti-lo. Quem nada tem, nada pode dar. Observe que a designação para o serviço que antes estava a cargo dos apóstolos (At 4:34,35) foi delegada pelo ato da imposição de mãos, como vemos no texto da separação dos diáconos para o “servir das mesas” (At 6:6)

2 Então, os doze convocaram a comunidade dos discípulos e disseram: Não é razoável que nós abandonemos a palavra de Deus para servir às mesas. 3 Mas, irmãos, escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, aos quais encarregaremos deste serviço; 4 e, quanto a nós, nos consagraremos à oração e ao ministério da palavra. 5 O parecer agradou a toda a comunidade; e elegeram Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo, Filipe, e Prócoro, Nicanor, Timão, Pármenas e Nicolau, prosélito de Antioquia. 6 Apresentaram-nos perante os apóstolos, e estes, orando, lhes impuseram as mãos. (At 6:2-6 RA)

Ainda, nesse mesmo sentido, vemos que os presbíteros de uma igreja, na ocasião em que um de seus membros era separado para o ministério, transmitiam da autoridade que outrora haviam recebido a este obreiro, como no caso de Timóteo, ocasião em que havia a transmissão de um dom específico de Deus ao novo ministro do evangelho pela imposição das mãos do presbitério ou de seus representantes (1Tm 4:14 ; 2 Tm 1:6).

Resta-nos, agora, tratar do conselho que Timóteo recebeu do apóstolo Paulo para não impor precipitadamente as mãos sobre ninguém.

22 A ninguém imponhas precipitadamente as mãos. Não te tornes cúmplice de pecados de outrem. Conserva-te a ti mesmo puro. (1 Tm 5:22 RA)

Em primeiro lugar, temos que observar o contexto em que essa advertência foi inserida, até porque texto fora do contexto só serve como pretexto para heresias e falsos ensinos. Vamos, pois, analisar o trecho em que o versículo em exame está incluído: 1 Tm 5:17-25.

Nos versos 17 e 18, vemos Paulo ensinando que os presbíteros que presidem bem devem ser especialmente honrados entre todos, não sendo razoável que se omita-lhes a provisão necessária para sua subsistência com dignidade.

No verso 19, Paulo ensina que os presbíteros devem ser dignos de crédito, respeito e consideração, cabendo à igreja confiar neles sempre, exceto quando houver testemunho de duas ou três pessoas que os desabonem.

Nesse caso, quando há testemunho de mal procedimento, Paulo, nos versos 20 e 21, passa a condenar os presbíteros que vivem no pecado e a orientar a Timóteo que os repreenda na presença de todos, para que os demais temam, pois é inconcebível que um ministro de Deus permaneça em pecado sem ser reprovado pelas autoridades da igreja.

Após fazer essas considerações e mostrar a Timóteo que o desejo de Deus é que seus ministros sejam santos e irrepreensíveis, Paulo adverte para que ninguém seja levantado ao ministério precipitadamente. O presbítero, para ser levantado, não poderia ser neófito (1 Tm 3:6), dado a maus hábitos (1 Tm 3:3) ou de testemunho falho (1 Tm 3:7). Assim, quando Paulo orienta Timóteo a não impor precipitadamente as mãos sobre ninguém, está se referindo ao ato de transmissão de autoridade e do dom especial para o exercício do ministério, conforme vimos anteriormente.

No verso 23, Paulo dá um conselho pessoal a Timóteo e no verso 24 torna a se referir ao zelo para não levantar um ministro precipitadamente. Paulo ensina que o passar do tempo prova os corações e revela quem são as pessoas. Alguns, no primeiro momento parecem santos, mas com o passar do tempo seus pecados e maus costumes se revelam. Por isso, no capítulo 3 dessa mesma carta Paulo orientou que os candidatos ao episcopado deveriam primeiramente demonstrar um caráter ilibado, saudável, temperante, sóbrio, modesto, não avarento etc.

Logo, no meu entender, o texto da “imposição precipitada de mãos” nada tem a ver com a imposição de mãos sobre enfermos e necessitados de auxílio espiritual.

Sobre sua questão, propriamente dita, posso compreender sua preocupação. Parece-me que você tem dúvidas quanto à restrição da ICM para a prática do ato de imposição de mãos, não é isso?

De fato, a Igreja Cristã Maranata limita o ato de imposição de mãos aos pastores e aos diáconos. Estes últimos com restrição, pois só podem impor suas mãos sobre os crentes da igreja. Se ao final do culto uma pessoa não crente ou de outra denominação pedir uma oração, o diácono está orientado a não impor suas mãos sobre ela.

A razão disso é que a liderança da ICM acredita que um diácono não tem autoridade espiritual suficiente para orar com imposição de mãos sobre um pecador oprimido pelo Diabo. Acreditam que o diácono pode se contaminar com o pecado do visitante ou atrair o espírito maligno que, eventualmente, ocupe a pessoa que está recebendo oração. Até mesmo pastores sentem algum receio de impor as mãos sobre determinadas pessoas. Parece que o ensino que recebem os deixa temerosos de, além de não conseguirem transmitir a bênção de Deus, saírem oprimidos da oração.

Confesso que, no passado, eu obedecia a essa orientação sem nunca ter refletido a esse respeito. Hoje, isso não me parece nada razoável. Aliás, no meu entender, demonstra uma certa fragilidade espiritual ou fraqueza antibíblica.

É bom lembrar que, quando os discípulos de Jesus oraram por um menino e não conseguiram expulsar o espírito maligno que o possuía, não tornaram para Jesus oprimidos ou endemoninhados. O fato deles não estarem suficientemente preparados não os tornou vulneráveis a um ataque maligno (Mt 17:19-21). Apenas não conseguiram os resultados que poderiam ter alcançado se estivessem na condição espiritual apropriada para a situação. É isso que acontece com muitos crentes fracos. Não estão preparados espiritualmente e não conseguem qualquer êxito numa batalha espiritual para libertar os cativos do Diabo. Isso não os deixa vulneráveis a ficarem oprimidos ou endemoninhados, mas apenas revela o quão fracos e despreparados são.

É claro que os discípulos de Jesus não devem viver em pecado, especialmente aqueles conhecidos, mas ocultos e não confessados, pois isso é uma brecha para a operação maligna. Creio que o ministério que recomenda que seus obreiros não imponham as mãos sobre os necessitados está a revelar que tem dúvidas sobre a integridade espiritual deles, visto que qualquer crente adequadamente preparado espiritualmente está bem protegido.

18 Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não vive em pecado; antes, Aquele que nasceu de Deus o guarda, e o Maligno não lhe toca. (1 Jo 5:18 RA)

3 Todavia, o Senhor é fiel; b ele vos confirmará e guardará do Maligno.[1] (2 Ts 3)

Note que aquele que nasceu de novo e recebeu o Espírito Santo, vivendo em santidade está imune a uma penetração maligna em sua vida, pois não há brecha para tanto. O crente em Jesus, perdoado, liberto, santificado e selado pelo Espírito Santo (Ef 1:13) não pode ficar endemoninhado. “Maior é o que está em vós do que aquele que está no mundo” (1Jo 4:4) e “não há comunhão da luz com as trevas nem harmonia de Cristo com o maligno” (2Co 6:14-15). Se o maligno não pode tocar um crente que não vive em pecado, também não pode possuí-lo (1Jo 5:18). Ademais, o crente tem uma armadura à sua disposição e deve usá-la permanentemente.

15 Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz; 16 embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do Maligno. (Ef 6:15-16)

Se eu admitir a possibilidade de ser possuído ou oprimido por um espírito maligno durante uma oração que faço por um endemoninhado, deverei, também, admitir que, igualmente, posso ser afetado por uma bruxaria ou maldição lançada contra mim, o que não acontece, pois contra Jacó não vale encantamento (Nm 23:23).

Mas, será que existe a possibilidade de um crente ser vencido por um espírito maligno durante uma tentativa de transmissão da bênção de Deus? Creio que isso só seria possível se esse “crente” não fosse um “crente” de verdade, tal como ocorreu com os filhos de Ceva, quando tentaram libertar um endemoninhado e, ao contrário, levaram uma bela surra, porque não tinham autoridade de um crente em Jesus. Aliás, nem conheciam a Jesus, mas estavam apenas usando seu nome, do mesmo modo como vemos muitas pessoas fazerem: não têm qualquer intimidade com Jesus, não conhecem sua palavra nem sua vontade, não se submetem aos seus ensinos, não aprenderam a amar seus irmãos, mas querem falar em seu nome e gozar do poder que ele outorga a seus discípulos. Veja o que pode acontecer nesses casos:

13 E alguns judeus, exorcistas ambulantes, tentaram invocar o nome do Senhor Jesus sobre possessos de espíritos malignos, dizendo: Esconjuro-vos por Jesus, a quem Paulo prega. 14 Os que faziam isto eram sete filhos de um judeu chamado Ceva, sumo sacerdote. 15 Mas o espírito maligno lhes respondeu: Conheço a Jesus e sei quem é Paulo; mas vós, quem sois? 16 E o possesso do espírito maligno saltou sobre eles, subjugando a todos, e, de tal modo prevaleceu contra eles, que, desnudos e feridos, fugiram daquela casa. (At 19:13-16)

Creio que apenas quem está na mesma condição dos filhos de Ceva deve temer enfrentar uma batalha espiritual.

Em resumo, entendo que nenhum crente em Jesus (homem ou mulher), liberto, santo e cheio do Espírito Santo deve temer impor suas mãos sobre um necessitado. Devemos crer que onde há luz as trevas não podem subsistir. Afinal, somos luz do mundo e não há comunhão de luz e trevas. Se há luz, não há trevas. Se não há luz, há trevas. A única exceção é quando se tratar de transmissão de autoridade ou dom de Deus, que deve ser reservada a quem Deus concedeu e outorgou o direito de transferi-la, de modo prudente, preenchidos todos os requisitos bíblicos, e não precipitadamente.

Portanto, amado, essa é apenas a minha visão sobre o assunto. Não espero que concorde comigo ou que você mude sua crença ou procedimentos. Melhor será para você obedecer o ministério ao qual você se sujeitou. Isso é grato diante de Deus.

O Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o seu rosto e te dê a paz.

Grande abraço,

Pastor Sólon.

 

 



b b 3.3 1Co 1.9; 1Ts 5.24. Fiel: Palavra que, em grego, está em contraste com a expressão porque a fé não é de todos, do v. 2.

[1]Sociedade Bíblica do Brasil. 1999; 2005. Bíblia de Estudo Almeida - Revista e Atualizada . Sociedade Bíblica do Brasil

p p 6.15 Is 52.7; Rm 10.15. Calçai os pés. O soldado romano usava botas que tornavam a sua marcha mais firme. Outra tradução possível do v. seria: Preparai-vos com firmeza para anunciar o evangelho da paz.